
Nestas últimas semanas, tenho enfrentado pensamentos endiabrados que me assaltam dia e noite. Disputam qualquer coisa que não sou capaz de designar. Perturbam o foco e atrasam a lavoura de quem tenta imperativamente concluir algo. Estou convencido de que aquilo que está mais perto de nós é o mais difícil de classificar. Felizes aqueles que têm força suficiente para avançar sempre adiante, mesmo quando a nossa cabeça não consegue encontrar um núcleo de bom senso para uma resposta hiperbólica. Mesmo quando nos esforçamos para avançar, mas o denânimo se curva sobre nós e nos enfraquece a mão que escreve e a boca que fala. Não falo aqui de actos de coragem perante uma adversidade, mas na capacidade de resistir às tentações emocionais que nos assombram tão intimamente que nos bloqueam a acção.
Diz Albert Camus que, “as dúvidas é o que temos de mais íntimo”, e eu acredito. Às vezes, é difícil sair de mim e fazer o que tenho de fazer. Mas não é a solidão que me assusta, são as minhas fraquezas. O meu verdadeiro inimigo é esse. Um autismo de expressão perante um acto que se torna hostil. É-me sempre muito difícil chegar às coisas, e só com algum gesto de pragmatismo, mostro aos outros também que existo e que não me faltam as forças. Só na escrita me consigo entender. Só com a escrita sinto-me apto a conversar com os outros. Só na escrita consigo retrair as emoções e discorrer com razão crítica. Se tudo isto é verdade, nas últimas semanas tenho vivido numa falácia. Não sei ao certo o que está a perturbar-me a acção, será cansaço? Qual é o porquê de não sentir-me seguro no que faço? Que espécie virtuosa abandonou a minha lida?
Talvez uma ruptura profilática com o trabalho e compassada ao ritmo de “Blu”, de Ryuichi Sakamoto, seja a ponte necessária para um encontro mais profícuo no regresso.